quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Lagrimas eleitoreiras


Tenho 26 anos de profissão, 23 dedicados a cobertura política. Já vi de tudo nesse país, onde a disputa pelo poder não envolve escrúpulos nem lealdade. Vi, por exemplo, uma viúva eleger-se prefeita sem pronunciar uma palavra sequer. Foi na Baixada Fluminense, mais precisamente no município de Belford Roxo, em 1996. O prefeito Jorge Júlio Costa dos Santos fora assassinado um ano e meio antes e um grupo de oportunistas resolveu lançar a esposa dele, Maria Lúcia Neto dos Santos, uma dona-de-casa que jamais pensara em atuar politicamente, muito menos ser prefeita de uma cidade cheia de problemas e de recursos parcos. O grupo a convenceu e lá foi Maria Lúcia pelos palanques da vida... Sem intimidade com as palavras, limitava-se a lembrar do marido, lavando de lágrimas um cadáver transformado em cabo eleitoral. Ela chorou tanto que seus lamentos comoveram o povo que a elegeu logo no primeiro turno. A administração foi um desastre. Tanto que em 2000 ela acabou massacrada nas urnas por um candidato que nunca havia pisado antes na cidade.

Narro agora essa história para exemplificar o que um grupo, interessado em manter seus interesses particulares, estaria preparando para Cabo Frio, se o chefe não tiver forças suficientes (eleitoral) e condições (jurídicas) para manter-se candidato a prefeito. Estou falando do deputado Alair Corrêa e seus aliados, gente – que desesperada pela queda nas pesquisas de intenção de votos – leva a disputa ao nível mais baixo.

Dia desses li no jornal do deputado, logo na primeira página, uma apelação de muito mau gosto. Não se tratava de uma viúva, mas de uma mãe lembrando a morte trágica de seu filho. Quem leu a matéria pode ter concluído, assim como eu, que o grupo não pensará duas vezes em substituir Alair pela esposa, mãe dedicada e zelosa, uma mulher – como milhares de outras – que ainda chora e chorará por toda a vida, a perda de um filho, externando sua dor. O texto falava em traição e sendo assim, resta perguntar: O que é traição para essa gente?

Nunca troquei uma palavrinha sequer com o prefeito Marquinhos Mendes. Só o vejo por fotografias. De sua vida pública (a particular não me interessa) sei apenas que foi vereador, deputado estadual, vice-prefeito e que em 2004 foi eleito prefeito com apoio de Alair, que certamente imaginou que estaria colocando um fantoche na cadeira que ocupou durante oito anos consecutivos.

Confesso que sei muito pouco ou quase nada sobre a política de Cabo Frio, mas se Alair diz que Marquinhos o traiu por ter decidido disputar a reeleição, afirmo que não houve traição alguma, pois o atual prefeito tem todo direito de desejar manter-se no cargo, submetendo essa vontade aos eleitores que, democraticamente, darão a resposta nas urnas. Baixaria não é o que o povo quer ver. Os eleitores esperam é por um debate claro de idéias. Também, acredito, o povo não gostaria de assistir a um espetáculo deprimente, de ver uma mãe chorando e suas lagrimas usadas para sensibilizá-los, preparando o terreno para um discurso nada criativo, versando sobre essa tal traição que ninguém sabe ao certo qual é.






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